– Gonçalo, deixa-me ver aí as notícias se faz favor, implorei ao meu filho mais velho, mal pus um pé fora da cama.
Farto de notícias deveria estar eu, porque no sábado tinha gasto quase três euros em cerca de 500 gramas de papel de jornal num saco de plástico. Além disso, comprei também o Público e desfolhei a Visão da minha mulher.
O problema estava em que, na verdade, o que me apetecia mesmo não era o papel, que costumo entregar na oficina do meu vizinho para ele utilizar nas pinturas. Eu queria era notícias frescas do Freeport, das falências, da crise, e de muitas outras coisas que certamente deveriam ter acontecido na noite em que eu repousava numa cama de casal. Preguiçoso como sou, apetecia-me ver o país e o mundo só com uns cliques!
– Papá, agora deixa-me acabar o jogo. Vai aí ao Magalhães!, responde-me o Gonçalo, sem desviar o olhar do ecrã onde jogava uma partida de snooker virtual.
– Oops, já nem me lembrava do Magalhães. Qual á a password que a tua irmã meteu nisso?, perguntei.
– Eu digo-te papá. É amo-temuitolopes. Só eu é que a sei porque, senão, eles fazem downloads e enchem-me o Magalhães de vírus, chilreou-me ao ouvido a Francisca, de 8 anos digitais.
– Ó Francisca, mas essa password é muito grande. Tens que arranjar uma mais pequena, sugeri-lhe.
– Tenho outra papá. É KIKA, mas amo muito o Lopes, confidenciou-me.
Como é fantástico e maneirinho este Magalhães! Mas... cada a coisa a seu tempo, pensei eu, recordando-me do gozo que me deu aquela lousa, emoldurada em pinho sem o bicho do nemátodo, que há coisa de uma semana tinha adquirido a um artesão, numa feira em Arganil. Senti-me como uma criança e ai de alguém que ousasse tocar na minha lousa, que também tratei de proteger com uma password, igualmente longa como a da Francisca: “proibidomexernaminhaescrivaninha”.
Como recordar é viver, lembrei-me dos erros que nós, miúdos aprendizes numa escola de província – onde tudo era demasiado provinciano –, escarrapachávamos naquelas negras ardósias. Sentença: vinte reguadas com uma régua de pinho, aparentemente, sem nemátodo. Que saudades tenho das mãos sobreaquecidas naquelas gélidas manhãs de Inverno... ao princípio era doloroso, mas cinco minutos depois o sistema até proporcionava algum conforto térmico.
– Estou? Quem fala?
– É pá, é o Xico!
– “Viva, Sr. Xico... então?”
– É pá, estou aqui nas Novas Oportunidades. Não queres vir almoçar?
– Como?
– É isso pá... agora o Sócrates é mais que meu pai! Dá-me quase 600 euros... e olha... estou a tirar o 11º ano.
– Está bem! Então, mas não tinhas uma empresa de venda de queijo da serra e de presuntos?
– Pois tinha pá, mas deitei-me abaixo nas finanças, e 600 euros são 600 euros...
– OK. Sim senhor! Mas, ó Chico, agora estou aqui na internet a pesquisar umas coisas para uma pós-graduação que ando a tirar em Coimbra… sinceramente, não me dá muito jeito.
– Pronto, pronto... deixa-te estar... agora também te dás com esse gajo, o Antero Neto?
– Mas qual Antero Neto, pá? Estou na Internet!
– Pi...pi...pi...pi.... caiu a chamada!
* Eu avisei o director do “J”. Preferia ter feito o Horóscopo... mas ninguém me ligou nenhuma! E tanta coisa que os astros me têm revelado. Poderia ter antecipado, por exemplo, que o Futebol Clube do Porto vai ser campeão; que a crise – pelo menos a minha – prolongar-se-á até quando Deus quiser, ou que o Vital Moreira vai ser deputado ao Parlamento Europeu…
Farto de notícias deveria estar eu, porque no sábado tinha gasto quase três euros em cerca de 500 gramas de papel de jornal num saco de plástico. Além disso, comprei também o Público e desfolhei a Visão da minha mulher.
O problema estava em que, na verdade, o que me apetecia mesmo não era o papel, que costumo entregar na oficina do meu vizinho para ele utilizar nas pinturas. Eu queria era notícias frescas do Freeport, das falências, da crise, e de muitas outras coisas que certamente deveriam ter acontecido na noite em que eu repousava numa cama de casal. Preguiçoso como sou, apetecia-me ver o país e o mundo só com uns cliques!
– Papá, agora deixa-me acabar o jogo. Vai aí ao Magalhães!, responde-me o Gonçalo, sem desviar o olhar do ecrã onde jogava uma partida de snooker virtual.
– Oops, já nem me lembrava do Magalhães. Qual á a password que a tua irmã meteu nisso?, perguntei.
– Eu digo-te papá. É amo-temuitolopes. Só eu é que a sei porque, senão, eles fazem downloads e enchem-me o Magalhães de vírus, chilreou-me ao ouvido a Francisca, de 8 anos digitais.
– Ó Francisca, mas essa password é muito grande. Tens que arranjar uma mais pequena, sugeri-lhe.
– Tenho outra papá. É KIKA, mas amo muito o Lopes, confidenciou-me.
Como é fantástico e maneirinho este Magalhães! Mas... cada a coisa a seu tempo, pensei eu, recordando-me do gozo que me deu aquela lousa, emoldurada em pinho sem o bicho do nemátodo, que há coisa de uma semana tinha adquirido a um artesão, numa feira em Arganil. Senti-me como uma criança e ai de alguém que ousasse tocar na minha lousa, que também tratei de proteger com uma password, igualmente longa como a da Francisca: “proibidomexernaminhaescrivaninha”.
Como recordar é viver, lembrei-me dos erros que nós, miúdos aprendizes numa escola de província – onde tudo era demasiado provinciano –, escarrapachávamos naquelas negras ardósias. Sentença: vinte reguadas com uma régua de pinho, aparentemente, sem nemátodo. Que saudades tenho das mãos sobreaquecidas naquelas gélidas manhãs de Inverno... ao princípio era doloroso, mas cinco minutos depois o sistema até proporcionava algum conforto térmico.
– Estou? Quem fala?
– É pá, é o Xico!
– “Viva, Sr. Xico... então?”
– É pá, estou aqui nas Novas Oportunidades. Não queres vir almoçar?
– Como?
– É isso pá... agora o Sócrates é mais que meu pai! Dá-me quase 600 euros... e olha... estou a tirar o 11º ano.
– Está bem! Então, mas não tinhas uma empresa de venda de queijo da serra e de presuntos?
– Pois tinha pá, mas deitei-me abaixo nas finanças, e 600 euros são 600 euros...
– OK. Sim senhor! Mas, ó Chico, agora estou aqui na internet a pesquisar umas coisas para uma pós-graduação que ando a tirar em Coimbra… sinceramente, não me dá muito jeito.
– Pronto, pronto... deixa-te estar... agora também te dás com esse gajo, o Antero Neto?
– Mas qual Antero Neto, pá? Estou na Internet!
– Pi...pi...pi...pi.... caiu a chamada!
* Eu avisei o director do “J”. Preferia ter feito o Horóscopo... mas ninguém me ligou nenhuma! E tanta coisa que os astros me têm revelado. Poderia ter antecipado, por exemplo, que o Futebol Clube do Porto vai ser campeão; que a crise – pelo menos a minha – prolongar-se-á até quando Deus quiser, ou que o Vital Moreira vai ser deputado ao Parlamento Europeu…
Henrique Barreto
henriquebarreto@correiodabeiraserra.com
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